sexta-feira, 23 de julho de 2010

GASPAR SILVEIRA MARTINS - UM DOS MAIORES INTELECTUAIS DO CONTINENTE



Gaspar Silveira Martins


O Correio do Povo de 25 de julho de 1901 estampava, em destaque a seguinte notícia: - "Tivemos ontem, pelo telégrafo, a triste notícia do falecimento, em Montevidéu, do Dr. Gaspar Silveira Martins. O patrício ilustre, cuja morte o Rio Grande deplora, tem o seu nome vinculado de modo imperecível à história do nosso Estado, que ele muito amou e por cujo progresso moral e material, muito se esforçou. O Rio Grande do Sul chora a morte de Silveira Martins que, com justa razão, figurará na galeria dos nossos varões ilustres como um grande patriota. A notícia da sua morte, espalhou-se ontem rapidamente pela Capital e, desde logo, os escritórios dos jornais foram procurados por grande número de pessoas que, pesarosas, pediam informações a respeito. O Dr. Gaspar Silveira Martins devia completar no dia 5 de agosto próximo, 66 anos de idade".Silveira Martins estava, ainda, no exílio em Montevidéu, apesar da paz de 1895, assinada em Pelotas, pondo fim à Revolução Federalista de que fora o chefe civil.Sua morte, ocorrida a 23 de Julho, treze dias antes de completar 66 anos de idade, em verdade muito abalou o mundo político brasileiro, principalmente o ligado ao federalismo, e sobremodo escandalizou a sociedade em virtude da situação em que se dera o falecimento do grande tribuno.Só, longe do lar, vivendo em hotel na capital uruguaia, homem fogoso, bastante dado a mulheres, jamais se negou aos prazeres da carne de que ele usava e abusava e foi por isso que sua morte, ao lado de uma dessas vivandeiras, à meia tarde, escandalizou, lamentando-se, porém, tenha sido esse o fim do tribuno que fazia temer o adversário desde a sua juventude, quando subiu pela primeira vez à tribuna parlamentar, ou quando, em 1869, proferiu aquela sua conferência clássica sobre o Radicalismo, abalando consciências e arrastando multidões.Era, na realidade, um fim muito triste, esse do ex-Ministro da Fazenda do Gabinete de 5 de janeiro de 1878, desse Ministro que havia proposto o voto aos acatólicos, exigindo reforma da Constituição, e que por não ser atendido, rompeu, não apenas com o Presidente do Conselho Cansansão de Sinimbu, mas com seu próprio companheiro Ministro da Guerra, senador Marquês do Erval.Entretanto, esse final melancólico da grande vida em nada afetaria as suas idéias, as suas atividades de patriota e progressista que jamais recuou e jamais vergou diante de potentados. Foi um homem de pensamento, como poucos tem tido o Brasil nestes seus quase quinhentos anos de História, no terreno político principalmente. E nem mesmo atingiu a integridade do homem que foi, durante sua vida, exemplo de dignidade, de dedicação, de honradez de homem público, líder inconteste do liberalismo brasileiro a partir do dia em que se apresentou na vida política da Nação. Iniciando-se na política, logo após sua formatura na Faculdade de Direito de São Paulo, em 1855, contando, pois, 21 anos de idade Gaspar Silveira Martins foi subindo, à custa de sua inteligência, de seu talento, de sua cultura. Degrau por degrau, chegou a Ministro, em 1878, com apenas 44 anos.Desde 1872, imperava na política liberal brasileira, arrastando após si os velhos liberais que vinham acompanhando o partido desde sua fundação, em 1837, ou desde sua reformuiação com ele presente, em 1860, quando recebeu definitiva organização e o definitivo programa.Aos 34 anos, em 1868, começou a sua grande ascensão. Diz-nos Joaquim Nabuco (Um Estadista do Império, p. 122 e segs.): "Já sob o ministério Itaboraí, podia-se distinguir a separação entre os liberais, a faixa radical. Um homem novo começava a aparecer na política, e revelava, desde seus primeiros atos, uma independência, uma iorça, uma audácia, como de certo ainda não se tinha visto, batendo as suas portas em nome de um direito até então desconhecido: o do povo.Era Silveira Martins. A figura do tribuno, como depois a do parlamentar, era talhada em formas colorsais; não havia nele nada de gracioso, de modesto, de humilde, de pequeno; tudo era vasto, largo, soberbo, dominador. Na cadeira de juiz, fazendo frente ao ministro da justiça; nas palestras literárias, pronunciando-se sobre as velhas raízes arianas; nas conferências públicas, fazendo reboar pelas cavernas populares o eco interminável de sua palavra; nos conselhos do partido democrático, falando aos chefes tradicionais, aos homens do passado, com a consciência e a autoridade de um conquistador bárbaro, ditando a lei à civilização decrépita, indefesa em sua tranquilidade imemorial; nas redações dos jornais amigos, nas confeitarias da Rua do Ouvidor, onde durante anos exerceu entre os moços e os exaltados a ditadura da eloqüência e da coragem, como Gambetta, durante o Império, nos cafés do Quartier Latin; nas rodas de amigos políticos, como Martinho de Campos, Otaviano, Teófilo Ottoni; depois, na Câmara dos deputados, onde sua entrada (legislatura de 1872-1875) assinala uma época e faz o efeito de um terremoto; no ministério, onde, incapaz de representar segundos papéis, mas sem preparação, talvez, suficiente para tratar negócios, só teve uma ambição: ganhar com a saída o que perdera com a entrada, e por isso ainda mais, como ministro demissionário do que como membro do Gabinete; por último no Senado, na independência, na soberba, com que, operada a sua transformação conservadora, atrai para si todos os rancores da democracia, que talvez tenha criado: em todas as posições, que se abateram diante dele para que ele entrasse sem subir, em todos os papéis que desempenhou, Silveira Martins foi sempre único, dilerente de todos os mais; possante e sólido, súbito e irresistivel, natural e insensível, como uma tromba ou um ciclone". (... ) "É o Sansão do Império. Desde logo é preciso contar com ele, que é, nesse momento, o que em política se chama povo, isto é, as pequenas parcelas de povo que se ocupam de politica".E mais adiante (p. 124): "... a passagem de Silveira Martins na nossa história contemporânea ficará sendo o impulso, o vigor extraordinário que a sua eloqüência inflamada, o seu sopro dantoniano, o seu ascendente sobre as multidões, imprimiu ao espírito da revolução no decênio de 1868 a 1878 e que ele em vão se ofereceu depois para reprimir".Aí está o retrato do grande Gaspar Silveira Martins, o tribuno máximo do Brasil Império, que entraria pela República, coerente com seus princípios, combatendo oligarquias e ditaduras, exigindo liberdades e direitos que se vinham conculcando, no Rio Grande do Sul, através de leis, de conchaves e de ordens subterrâneas, num desrespeito integral à dignidade humana do adversário. Nasceu dai a Revolução, revolução que ele, Gaspar Martins, não queria, mas teve que aceitar porque o povo, aquele mesmo povo que ele conduziu e educou nos princípios da liberdade e do radicalismo que sempre pregou, o quis e o obrigou a presidir, como chefe civil.E ele, que jamais cedia, mas procurava sempre harmonizar, desde que beneficiasse ao povo e à Pátria, foi obrigado a assistir à hecatombe terrível que foi a violenta carnificina humana daquela revolução que se fez contra sua vontade, a de 1893-95, e que, finalmente, conseguiu paralisar após lutas e mais lutas diplomáticas, até conseguir um mediador capaz de compreender a situação, compreender o povo, e firmar a paz.Silveira Martins, aliás, "jamais fora partidário da guerra civil". Quando, em meados de 1892, o General Joca Tavares, à frente de numerosas forças patrióticas, se achava em Bagé disposto a dar combate às tropas federais, que, a mando do governo da União, haviam mudado a situação política do Rio Grande do Sul, -.ele passava ao venerando militar este telegrama, que se tornou célebre e em quem se descortinava facilmente. a alta capacidade do homem de Estado: - "General Silva Tavares Bagé - Governo central apóia com praças federais situação política por ele criada no Estado. Por mais imensas sejam tropas que comandais, se não desarmadas, terrível guerra civil, maior flagelo pode cair sobre um povo, terá fatais conseqüências. Centro não pensou que guerra neste Estado abalará toda Federação, não ainda consolidada. Como, em 1835, guerra pode tornar-se independência. Como, em 1835, intervindo Repúblicas vizinhas, pode tornat-se externa. Nossa grande pátria, dilacerada por ódios, enfraquecida pela intolerância se dissolverá! Que brasileiro hesitará fazer maximo sacrifício para evitar irreparável calamidade? Patriotismo manda suportar tudo. Proteste contra precedente; ressalve direito Estado; mas entre acordo desarmar. Não ficará menor, antes muito elevado. Haverá descontentes, que. não têm sua responsabilidade. Históra, porem, registrará feito mais Patriótico veterano Geurra Paraguai. General Mitre, à frente sete mil homens, depôs armas em 'La Verde' para não arruinar pátria pela guerra civil. Mitre ainda é, o cidadão mais respeitado de toda confederação. Não comandastes em chefe exército aliado; não fostes chefe de Estado, como Mitre; mas não sois menos brasileiro do que o Mitre argentino. Haveis de proceder como ele. Chefe do partido, aconselho, cqrreligionário, peço; riograndense, suplico. Guerra civil não. Não é necessário isso para conquistar poder, conter governo federal; lutando contra dificuldades de todo gênero, erros naturais. Liberdade de imprensa, opinião, fazem o que violência não consegue. Só força maior tem.impedido achar-me aí pedir verbalmente a manifestar, todo transe necessidade evitar guerra civil. - Gaspar Martins".Mas não foi possível evitar a luta. As provocações foram excessivas e Joca Tavates com Gumerdindo Saraiva, invadiram o Rio Grande do Sul pensando calarem de imediato as diatribes e arbitrariedades que campeavam pelo Estado, ordenadas, provdcadas, consentidas pelo governo de Castilhos. E,Gaspar Martins não teve outro remédio: aceitar a revolução que não queria, que jamais quis. Paulo José Pires Brandão, neto materno e afilhado do Conselheiro Antonio FerreiraViana, conheceu Silveira Martins em casa do avô. Em seu livro Vultos do MeuCaminho, assim descreve o imortal conselheiro:"Alto, corpulento, grandes óculos, barba toda aberta e branca, pele muito vermelha. Voz de trovão, gesto largo, não sabia falar baixo, e mesmo quando palestrava era em tom de discurso, e a sua voz clara, sonora e forte invadia a sala onde estava, os corredores, o hall, a casa inteira, atravessando a rua. Não falava ao ouvido de ninguém, não dizia segredos, nem os tinha, mesmo porque a sua voz não dava diapasão para sussurros, não murmurava: tonitroava".Mais adiante diz que Lafaiete Rodrigues Pereira costumava dizer que "Silveira Martins é, como Anibal, superior às forças da natureza". E conta estas passagens da vida infantil do tribuno: "Desde muito criança eu admirava e amava Silveira Martins, ouvindo-o, boquiaberto, contar casos do Rio Grande, histórias de cavalos, dos petiços de pernas curtas, dum célebre baio de crinas douradas e estrela na testa, que ele possuía quando menino...", e continua a transcrever evocações para dizer depois: - "Silveira Martins não contava essas histórias só para mim, contava-as para a gente grande, mas em tal linguagem, com tal poder descritivo, que não eram só as crianças, mas até os criados que paravam o serviço para ouvi-lo".E pouco mais adiante: - "Mal sabendo as primeiras letras, ao matricular-se no colégio, perguntou-lhe o mestre: 'Menino, quando você terminar aqui os seus estudos, que é que vai ser?, - 'Ministro de Estado!', respondeu Gaspar. E foi Ministro de Estado, ocupando a pasta da Fazenda. E que ministro! O mais popular de todos; e ainda hoje acham-se Gasparinhos aos bilhetes de loteria, cuja venda ele autorizou". Foi imensamente criticado elogiado e atacado. Angelo de Agostini com seu genial lápis não o poupava, denominando-o Tio Gaspar. Caricaturou-o de todas as formas e maneiras, na sua popularíssima Revista Ilustrada. No Rio Grande do Sul, também não foi poupado pelo lápis do calunguista de O Século, de Miguel de Werna, o feriníssimo urso que tinha pavor de liberais e republicanos.Com a Proclamação da República, estando Gaspar Martins na Presidência do Rio Grande do Sul, foi preso e deportado.Pouco antes do 15 de novembro de 1889, fora Gaspar chamado à Corte para formar novo Ministério, com intenções de evitar a queda fatal. Foi tarde, porém. Ao chegar no porto de Desterro (depois Florianópolis), já a República havia sido proclamada e Gaspar Martins aprisionado. Seguiu para a Europa.Lá o encontrou Pires Brandão, que viajava com o avô, também deportado. E conta que, ao atravessar o Canal da Mancha, encontra a bordo o diplomata e jornalista francês Tachard, a quem foi apresentado. Diz Pires Brandão: "Falou Silveira Martins toda a travessia. Ao desembarcar na Inglaterra, disse Tachard a meu avô: Não há no mundo governo e instituições que possam resistir a um homem como este, que atravessa a Mancha discutindo Renan! Um país que deporta um homem desses, ou é um país de sábios ou de ignorantes".- "Homem de ferro, coração de ouro, patriota notável, adorado e odiado, Gaspar Silveira Martins desdobrava, improvisamente passando fugaz, num fulgor instantâneo e desaparecendo - a sua estatura atlética, de Danton", no dizer de Euclides da Cunha, que assim o descreveu: ". . . Ouviu-se dentro da Câmara dos Deputados uma palavra estranha com a tonalidade imponente dessas vozes proféticas que anunciam a ruína dos impérios. Não era a dialética vibrátil de Zacarias, a argumentação fria, sulcada de súbitos lampejos de gênio, de Nabuco, a fluência cantante de José Bonifácio, ou o período artístico e sonoro de Sales Torres Homem, a que se havia afeiçoado o nosso parlamento. Mas uma eloqüência quase selvagem na sua esplêndida rudeza, na energia nunca vista com que reivindicava os direitos populares, e nas suas rebeldias da forma, e nas suas grandes temeridades de conceitos..."Gaspar Silveira Martins nasceu em Cerro Largo, República Oriental do Uruguai, a 5 de agosto de 1834, na estância avoenga, sendo batizado a 5 de março de 1835.Mário Teixeira de Carvalho, que estudou profundamente a questão do nascimento de Gaspar Martins, afirma, depois de apresentar o registro de que requerera certidão, da "Paroquia de Nuestra Seilora del Pillar y San Rafael de Cerro Largo": "O grande Gasspar nasceu em Asseguá, na 5a secção do Departamento de Cerro Largo, no Uruguai, mesmo junto à fronteira brasileira, na casa da Fazenda de Assegud, pertencente a seu avô materno, o Grande-Dignitário João Antônio Martinsll. Foram pais de Gaspar Silveira Martins, o estancieiro Carlos Silveira e sua esposa Dona Maria Joaquina Martinez, na realidade Dona Maria Joaquina das Dores Martins, conforme consta do inventário arquivado no Arquivo Público do Estado (lo Cartório do Clvel e Crime de Bagé, Ano de 1890, no do feito: 158, maço -3, estante, 42). A vida de Gaspar Silveira Martins está cheia de lances admiráveis, desde a infância à morte, e descrevê-la devidamente, seria ocupar algumas centenas de páginas, pois seu nome resplandeceu no Brasil inteiro, de 1868 a 1901, quando melancolicamente, desaparecia dentre os vivos, em Montevidéu...

Texto de Walter Spaldingmais sobreSilveiraMartins:

http://educacao.uol.com.br/biografias/ult1789u714.jhtmColaboração: Hilton Araldi

http://prosagalponeira.blogspot.com/2010/07/gaspar-silveira-martins.html

terça-feira, 6 de julho de 2010

Antônio de Sousa Neto


Em 1º de Julho de 1866 morre, em decorrência de ferimentos de combate na Batalha do Tuití, Guerra do Paraguai, o General e líder da Revolução Farroupilha Antônio de Souza Netto

Aqui descansam os restos mortais do Brigadeiro Antônio de Souza Netto, falecido na cidade de Corrientes em 1º de julho de 1866". É o que se lê na lápide do mausoléu (a esquerda da foto) do proclamador da República Rio-Grandense, no cemitério de Bagé,
para onde foram transladados, e definitivamente guardados a 29 de dezembro de 1966.




Mas foi em Bagé que Antônio de Souza Neto desenvolveu a maior parte de sua enorme atividade de guerreiro defensor da Liberdade, da República, da dignidade do Brasil Império que êle profundamente amava como sua Pátria, mas detestava como monarquia. E por isso, feita a paz de Poncho Verde a l de março de 1845, que pos fim à República Rio-grandense por êle proclamada a 11 de setembro de 1836, destinada a unir-se a todo o Brasil republicano, concordou com os chefes da República que findava para a pacificação do Rio Grande, mas se retirou para Corrientes, República Argentina, exilado voluntário, mas sempre atento às atividades político-sociais do Brasil.
Estancieiro no Uruguai, com seus campos talados e vazios que tudo lhe levara a Revolução Farroupilha a que se dedicara de corpo e alma - para aí se transportou após alguns anos de repouso em Corrientes. E, nas margens do Queguaí, ao norte de Paissandu, tornou-se, em breve, por sua capacidade de trabalho e inteligência, adiantado estancieiro.
Mas jamais abandonou sua terra natal e seu povo. Sempre de olhos atentos, de quando em quando visitava a sua Bagé dos Campos do Seival, onde proclamara a República Rio-Grandense, tomando conhecimento direto dos acontecimentos. E daí saiu, em 1851, com sua cavalaria Brigada de Voluntários Rio-Grandenses - que organizara à sua custa inteiramente, para os campos da luta contra a ditadura de Rosas, o que lhe valeu a promoção a Brigadeiro Honorário do Exército Brasileiro, e a transformação de sua Brigada de Voluntários Gaúchos, em Brigada de Cavalaria Ligeira. Vencido o ditador, voltou à sua estância em Queguaí, para novamente regressar ao Rio Grande do Sul, em 1864, como representante dos estancieiros brasileiros no Uruguai - estancieiros residentes aí -, a fim de apresentar ao govêrno imperial as q ueixas contra assassínios e roubos ali praticados contra êle e seus concidadãos.
Aliás, já em 1859 havia reclamado, violentamente declarando que, se o govêrno imperial não tomasse providências, êle, Neto, organizaria sua fôrça e assumiria a responsabilidade de invadir o Uruguai e vingar seus concidadãos. Regularizada a situação, com contemporarizações, e algumas medidas preventivas, em breve tudo voltou ao que era dantes e, novamente agredidos com violência, tornou ao Rio Grande do Sul, mas desta vez com podêres maiores. E, com êsses podêres, foi ao Rio de Janeiro e aí, na côrte, onde foi acolhido com bastante afeto, depôs as queixas perante S. M. D. Pedro II. Pouco mais tarde, à frente de sua Brigada de Cavalaria Ligeira, fazendo a vanguarda do Exército, sob o comando do Marechal João Propicio Menna Barreto, invadia o Estado Oriental do Uruguai, - em auxílio do Presidente eleito da República, Don Venâncio Flores, tomando parte no assalto às trincheiras de Paissandu, onde também se sagrou, no ataque por água, o imperial marinheiro Marcílio Dias, recebendo seu batismo de fogo.
Dessa campanha somente regressou a 20 de fevereiro de 1865 para trabalhar com seus patrícios contra o invasor paraguaio. Sua cavalaria ligeira, nos rencontros entre São Borja e Uruguaiana, até a rendição a 18 de setembro de 1865, ostentou, sempre, ao lado da imperial bandeira do Brasil, o pavilhão tricolor da República Rio-Grandense. Aliás, nessa sua fôrça eram numerosos os oficiais e soldados que o haviam acompanhado durante a Revolução Farroupilha.
Em seguida, incorporada a sua fôrça ao Exército do General Manoel Luís Osório, comandante em chefe das tropas em ação no Rio Grande do Sul, Neto transpôs, logo após a rendição de Uruguaiana, o rio Uruguai, marchando por terra até o território paraguaio. E aí, batendo-se com excepcional bravura em Estero Bellaco a 2 de maio de 1866, e depois em Tuiuti a 24 do mesmo mês e ano, foi gravemente ferido. Transportado para o Hospital Militar de Corrientes, faleceu a 1 de julho do mesmo ano, naquele nosocômio.
Antônio de Souza Neto, tropeiro de profissão, soldado por imposição da Pátria, - primeiro a Pátria Rio-Grandense e depois a grande Pátria Brasileira, - passou sua existência a serviço da liberdade e da justiça, para o bem do Brasil e do Rio Grande do Sul.
Iniciando sua vida de estudante em Pelotas, com seus irmãos Rafael e Domingos, foi em seguida para Bagé, onde se dedicou à criação de gado. Tropeiro, percorria o Rio Grande e o Estado Oriental, sendo por seu caráter, por sua dignidade e apresentação pessoal, querido e respeitado por todos. Afeiçoado às carreiras, possuía o melhor plantel de cavalos de corridas em cancha reta.
Como todo o rio-grandense que se prezava, naqueles tempos, também Antônio de Souza Neto se apresentou e foi soldado. Aos 28 anos de idade era capitão de segunda linha. E antes de completar 35 era coronel de legião, em Bagé, onde dia a dia aumentava de prestígio por seu valor, capacidade e inteligência, a par de um coração boníssimo, sempre pronto a proteger o fraco contra as injustiças, e a justiça contra as violências.
o movimento farroupilha, organizado e dirigido por Bento Gonçalves da Silva, encontrou Antônio de Souza Neto já preparado para a defesa dos direitos e liberdades do Rio Grande. E quando rebentou a Revolução, a 20 de setembro de 1835, o valoroso coronel comandante de legião da Guarda Nacional de Bagé de imediato organizou, auxiliado por José Neto, Pedro Marques e Ismael Soares da Silva, o corpo de cavalaria que um ano mais tarde se destacaria nos Campos do Seival, derrotando o grande cabo de guerra imperial General João da Silva Tavares e proclamando a República Rio-Grandense, livre e independente, para livrar o povo rio-grandense "a não sofrer por mais tempo a prepotência de um govêrno tirano, arbitrário e cruel como o atual".
Promovido a General da República Rio-Grandense, o grande amigo e admirador de Bento Gonçalves da Silva pouquíssimas vêzes foi vencido durante aquêles quase dez anos de lutas constantes de um país inteiro, bem armado e municiado, contra um pugilo de homens livres do Rio Grande do Sul que, sem jamais tirarem os olhos da grande Pátria, preferiam a morte a um acôrdo desairoso.
E foi ainda Antônio de Souza Neto que, na primeira tentativa de pacificação, em novembro-dezembro de 1840, proposta por Francisco Alvares Machado em nome do govêrno imperial, respondeu à consulta de Bento Gonçalves: - "Enquanto tivermos mil piratinenses e dois mil cavalos, a resposta será esta", dissera, pondo a mão direita nos copos de sua espada, porque as propostas não haviam sido feitas com muita lisura e estavam muito aquém da dignidade daqueles heróis que se batiam contra o Império, sacrificando tudo por um ideal: saúde, família, bem estar, fortuna e propriedades.
O semanário ilustrado de Pôrto Alegre, 'Sentinela do Sul', n.' 7, de 18 de agôsto de 1867, publicando uma bela litografia de I. Weingaertner, retrato do Brigadeiro Antônio de Souza Neto, assim termina seu comentário biográfico do proclamador da República RioGrandense:
- "Faleceu, pois, o General Neto no cumprimento do mais sagrado dos deveres; e tanto mais apreciável é a sua dedicação quanto é certo que a sua extraordinária riqueza e o prestígio de que gozava o tornavam de tal maneira independente, que tudo quanto fêz foi inteiramente espontâneo e somente inspirado pelo amor à Pátria".
Realmente, Souza Neto, que se iniciara na vida pública como tropeiro, depois de ter pequena fortuna, entregou-se inteiramente aos ideais políticos consagrados na República Rio-Grandense. Depois, reiniciando e reconstituindo sua fortuna, residindo e com propriedade enorme fora da Pátria, nada mais precisava fazer, e tanto assim que, apesar de pequenas perseguições a agregados seus, fôra sempre respeitado e temido no Uruguai, abalou-se, a bem da justiça, de sua estância e novamente, de armas em punho, defendeu os direitos do Brasil, primeiro, contra Rosas, depois contra Aguirre e, finalmente, contra Solano López, do Paraguai.
E aí faleceu, vitimado em combate, no imortal combate de Tuiuti, onde outro gaúcho de fibra, Osório, brilhou mostrando ao mundo o valor, a inteireza e a nobreza do povo sul-rio-grandense.
Antônio de Souza Neto, como Manoel Luís Osório, são autênticos símbolos de um povo e legítimos guias da mais briosa cavalaria do mundo: a Cavalaria do Rio Grande do Sul, - hoje colocada à margem pela motorização, pelos cavalos-vapor... menos belos, menos brilhantes, mas mais temerosos.













Retrato do General Antônio de Souza Neto, óleo sobre tela, século XIX. Acervo do Museu Júlio de Castilhos, Porto Alegre, Brasil.


Antônio de Sousa Neto

Antônio de Sousa Netto (Rio Grande, 25 de maio de 1803 — Corrientes, 2 de Julho de 1866) foi um político e militar brasileiro, um dos mais importantes nomes do Rio Grande do Sul. É reconhecido por seu árduo trabalho na Revolução Farroupilha, que durou quase dez anos (de 1835 a 1845), como o segundo maior líder revolucionário.
Nasceu na estância paterna, em Capão Seco, no distrito de Povo Novo, da atual cidade de Rio Grande; lá é lembrado pelo CTG General Netto (de Povo Novo). Era filho de José de Sousa Neto, natural de Estreito (São José do Norte), e de Teutônia Bueno, natural de Vacaria. Por parte de pai, era neto de Francisco Sousa, natural de Colônia do Sacramento. O seu bisavô, Francisco de Sousa Soares, fora oficial de Auxiliares no Terço Auxiliar de Colônia do Sacramento e casara, em 1791, com Ana Marques de Sousa na capela da Fortaleza São João.[1]
Descendia, pelo lado materno, do bandeirante João Ramalho, que vivia em São Paulo antes do povoamento e que casou com a índia Bartira (Isabel), filha do cacique Tibiriçá. Também pelo lado materno, descendia do paulista capitão-mor Amador Bueno da Veiga.
Era coronel comandante de legião da Guarda Nacional de Bagé, quando participou da reunião que decidiu pelo início da Revolução Farroupilha em 18 de setembro de 1835, na "Loja Maçônica Filantropia e Liberdade". Organizou, junto com José Neto, Pedro Marques e Ismael Soares da Silva, o corpo de cavalaria farroupilha. [1] Era o general da primeira brigada do exército liberal republicano.
Em 1° de junho de 1836, participou do ataque a Rio Grande sem sucesso. Após a Batalha do Seival, proclamou a República Rio-Grandense, no Campo dos Menezes, a 11 de setembro de 1836. Lutou em diversas batalhas pelos republicanos, tendo comandado o cerco a Porto Alegre, durante vários meses, e a retomada de Rio Pardo, que estava nas mãos dos imperiais.
Em 7 de janeiro de 1837, travou o combate do Candiota, em que foi derrotado por Bento Manuel, mas já no dia 12 de janeiro, em Triunfo, vencia as tropas do coronel Gabriel Gomes, que morreu em combate.
Em abril de 1837 comandou a conquista de Caçapava, recebendo a adesão dos novecentos homens da guarnição imperial ali comandada por João Crisóstomo da Silva, apoderando-se de quinze peças de artilharia, quatro mil armas de infantaria e farta munição de boca e de guerra.[2] Esses recursos possibilitaram a subsequente conquista de Rio Pardo, a 30 do mesmo mês, levando a que o comandante militar da Província, marechal Barreto, respondesse a um Conselho de Guerra.
Em Rio Pardo, em 30 de abril de 1838, junto a Davi Canabarro, Bento Manuel e João Antônio da Silveira, derrotou os legalistas, comandadados por Sebastião Barreto Pereira Pinto e os brigadeiros Francisco Xavier da Cunha e Bonifácio Calderón. Em 18 de junho de 1840, acampado perto do Arroio Velhaco, foi atacado de surpresa por Francisco Pedro de Abreu e perdeu diversos homens, inclusive o coronel José de Almeida Corte Real, um dos melhores oficiais farroupilhas.[2]

Abolicionista ferrenho, foi morar no Uruguai após a guerra, com os negros que o acompanharam por livre vontade e onde continuou com a criação de gado.
Retornou à luta em 1851, na Guerra contra Rosas, com sua cavalaria na brigada de Voluntários Rio-Grandenses, organizada inteiramente à sua custa, o que lhe valeu a promoção a brigadeiro Honorário do exército, e a transformação de sua brigada em Brigada de Cavalaria Ligeira.[1]
Voltou ao combate na Guerra contra Aguirre e depois, juntamente com seu exército pessoal, na Guerra do Paraguai. No comando em brigada ligeira fez a vanguarda de Osório na invasão do Paraguai, no Passo da Pátria, em 16 de abril de 1866. Sua brigada ostentava sempre, ao lado da bandeira do Brasil Imperial, o pavilhão tricolor da República Rio-Grandense. [1] Na batalha de Tuiuti, foi importante na defesa do flanco da tropa brasileiro, mas foi ferido a bala e mandado para um hospital em Corrientes, Argentina, onde morreu e foi inicialmente sepultado. Em 1966, no centenário de sua morte, seu corpo foi exumado e transferido para um mausoléu em Bagé.
Representações na cultura
O General Netto já foi retratado como personagem no cinema e na televisão
• interpretado por Werner Schünemann no filme "Netto perde sua alma" (2001)
• interpretado por Tarcísio Filho na minissérie "A Casa das Sete Mulheres" (2003).
• interpretado por Werner Schünemann no filme "O general e o negrinho" (2006)
Na literatura brasileira:
• Tabajara Ruas : Netto perde sua alma. 1.ed. Editora Record, 2001. 160 p. ISBN 8501062642






Origem: Material recolhido do livro Construtores do Rio Grande, autoria de Walter Spalding. Livraria Sulina Editora, 1969.
Publicado em 29/05/2001.
A CASA DE GOMES JARDIM

Uma das mais antigas construções do município de Guaíba, a Casa de Gomes Jardim originalmente foi sede da Estância das Pedras Brancas e pertencia a Antônio Ferreira Leitão. Na época de sua construção, fins do século XVIII deram-se o princípio do processo de colonização da região, antes habitada por índios pertencentes ao grupo tupi-guarani. No início do século XIX, a sede ganhou novo proprietário: José Gomes de Vasconcellos Jardim, que se casou com Isabel Leonor Ferreira, filha de Ferreira Leitão.Por ser Gomes Jardim um dos líderes farrapos, o cenário composto pela Casa e o Cipreste histórico - hoje patrimônio do estado, serviu a um dos momentos mais importantes da Revolução Farroupilha, pois ali os líderes Farrapos planejaram a tomada da Capital da Província em 1835.À frente da casa, à sombra do cipreste - monumento natural presente no hino, no brasão e na bandeira de cidade - foram traçadas as atitudes derradeiras para dar início a maior guerra da história brasileira. Também foi nesta casa que, dois anos após o término da Revolução Farroupilha, já adoentado, morreu seu grande líder General Bento Gonçalves da Silva.Durante o século XX, acompanhando o desenvolvimento da urbanização, a casa sofreu algumas alterações em sua fachada. Sua arquitetura, caracterizada exclusivamente pelo estilo colonial português em um primeiro momento, sofreu modificações executadas de acordo com o estilo eclético clássico, nas rimeiras décadas do século XX.Os fatos apresentados revelam que a casa de Gomes Jardim está ligada tanto aos processos históricos de formação da cidade de Guaíba como aos do Rio Grande do Sul. Em razão disto, a sua visitação está incluída na programação do projeto "Turismo na Costa Doce", uma iniciativa promovida pelo SEBRAE/RS que visa incentivar o turismo cultural, rural e náutico da região litorânea do estado, contribuindo com a sustentabilidade econômica das respectivas comunidades.A casa de Gomes Jardim, obra tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado, é um monumento de fundamental importância para preservação da memória da cidade de Guaíba. É reconhecidamente uma das mais antigas construções do município, onde, a partir do seu entorno, desenvolveram-se as relações econômicas, sociais, políticas e culturais formadoras da identidade societária guaibense e do próprio Rio Grande do Sul.

: Angélica Fraga